Festa junina na escola é oportunidade para conectar o currículo com a cultura popular

Especialistas e educadoras dão dicas de como aproveitar o festejo para promover um resgate das tradições 

O mês de junho chega com a temporada de festas juninas. Por todo país, especialmente na região Nordeste, o festejo é tão tradicional que, neste ano, foi reconhecido pela Lei 14.555/23 como uma manifestação da cultura nacional. Na escola, o período também é aguardado com entusiasmo por professores, estudantes e famílias, que se divertem com danças, brincadeiras e quitutes típicos. Como aproveitar essa celebração para também promover novas experiências de aprendizagem? Para especialistas e educadoras ouvidas pela Vivescer, a festa junina na escola é uma oportunidade valiosa para conectar o currículo com a cultura popular e o resgate das tradições.  

Mais do que ser uma data tradicional no calendário escolar, a festa junina deve provocar reflexões sobre identidade, história e cultura. “Ela não deve ser feita só para cumprir um evento. É preciso pensar no seu propósito. Eu faço festa junina na escola porque é importante que as pessoas preservem e reconheçam a cultura”, afirma a historiadora e especialista em educação Claudia Siqueira.  

“Eu faço festa junina na escola porque é importante que as pessoas preservem e reconheçam a cultura”

Quando a aproximação entre o currículo e a cultura não acontece, a escola perde a chance de trazer novos sentidos para o ato de aprender. “Quem disse que não podemos aprender em uma festa? Não se pode perder a oportunidade. Genuinamente, a festa junina nos leva para a função social da aprendizagem”, ressalta Claudia. No entanto, ainda existe uma visão muito distorcida sobre a cultura popular e o lugar que ela ocupa na escola. “Por que pintamos o dente do caipira como se fosse um dente estragado? Por que a roupa dele é remendada? Temos uma visão muito distorcida do homem do campo, como o Jeca [personagem criado por Monteiro Lobato na obra Urupês]”, diz.  

Um mergulho na cultura e nas tradições 

Para que os estudantes compreendam as origens, os significados e os símbolos da festa junina, é importante que esse trabalho não aconteça apenas no mês de junho, de uma forma isolada. Na Escola Experimental, em Salvador (BA), a celebração faz parte do calendário pedagógico e, consequentemente, dos projetos que são desenvolvidos no primeiro semestre. “É uma tradição da nossa escola, algo que é muito marcante no Nordeste e na Bahia. Nós começamos a pensar nesse momento no início do ano”, conta a diretora pedagógica Flávia Mendes. 

“Todo ano elegemos um tema ou aspecto relacionado à nossa cultura, e ele é investigado pelas crianças nas áreas de música, teatro e artes visuais”, explica Flávia. Neste ano, a festa que vai acontecer no dia 17 de junho tem como tema o ritmo do baião e os seus principais representantes, incluindo nomes como Luiz Gonzaga, Carmélia Alves, Marinês, Dominguinhos e Sivuca. “Eles pesquisaram muito e vão contar essa história, sobre o ritmo e a importância dele para nossa cultura.”

A definição do tema sempre parte de uma construção coletiva na escola. “Já fizemos homenagem à literatura de cordel, ao repente, ao artista e poeta J. Borges. Elegemos temáticas e manifestações que são importantes e devem continuar sendo alimentadas”, afirma a diretora pedagógica. “Percebemos que as crianças de fato fazem um mergulho na cultura, compreendendo a representatividade nas vidas delas.”

Na Escola Magnus Domini, em Maringá (PR), o tema que mobilizou a festa junina deste ano foi o Sertão e o casal de cangaceiros Lampião e Maria Bonita. A celebração, realizada no dia 3 de junho, fez um passeio por diferentes canções da música popular brasileira, passando referências como “Lampião Falou”, de Luiz Gonzaga, “Feira de Mangaio”, de Clara Nunes e “Touro Mocho”, de Almir Sater. Ao som de música ao vivo, com a participação do grupo de forró da cidade, Rosa Açucena, estudantes do primeiro ao nono ano do ensino fundamental apresentaram coreografias e trabalhos desenvolvidos durante o semestre. 

A partir da conexão entre diferentes áreas do conhecimento, eles foram convidados se debruçar sobre a história do cangaço, ler cordéis, criar desenhos com a técnica de xilogravura e observar as representações e os símbolos do sertão nas artes, passando por Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Alfredo Volpi e Militão dos Santos. “A temática é imensamente plural e especialmente rica em detalhes e possibilidades. Acredito que o trabalho interdisciplinar é muito bem-vindo e torna a proposta mais envolvente. Há raízes fortíssimas da nossa cultura popular que partem do Nordeste Brasileiro e merecem ser vivenciadas, respeitadas e destacadas na rotina escolar”, reforça a diretora pedagógica da Escola Magnus Domini, Larissa Marega. 

De acordo com ela, a diversidade também é ponto de partida para esse trabalho. “Quando nos aproximamos da realidade de outros povos, outras culturas, outros saberes, encontramos oportunidade de crescer enquanto cidadãos, agentes de transformação deste mundo”, afirma Larissa.  

Como planejar a festa junina na escola 

Além de reforçar o papel da festa junina dentro da escola, as especialistas e educadoras ouvidas pela Vivescer deram dicas sobre como aproveitar o festejo para trabalhar a cultura popular e as tradições brasileiras. 

Confira algumas sugestões para organizar a festa junina da sua escola: 

1) Defina um tema gerador para a sua celebração

Você pode focar em um ritmo musical, uma região do país, uma personalidade importante para a cultura popular, um gênero literário, entre outros aspectos que estão relacionados ao festejo. 

2) Insira a festa junina no seu calendário de aprendizagem 

É muito importante que a festa não seja um evento isolado. Para desenvolver um trabalho contextualizado e significativo, é importante fazer um planejamento pedagógico e envolver professores de diferentes disciplinas. 

3) Estabeleça conexões com as áreas de conhecimento 

A festa pode render um trabalho interdisciplinar, que conecta várias áreas do conhecimento. 

4) Estude sobre as origens e os símbolos da festa junina 

As pesquisas sobre o universo da festa junina e as suas tradições são fundamentais para não reproduzir estereótipos e não cair na armadilha de fazer um evento vazio de sentido. 

5) Trate da festa junina como uma manifestação cultural 

A origem da festa junina é pagã, apesar de ela ter sido incorporada pelo catolicismo. Tente focar no evento como uma manifestação cultural, e não religiosa. 

6) Convide grupos locais para participar 

A festa junina também pode ser uma boa oportunidade para valorizar grupos locais de música, dança ou teatro, ampliando o papel da escola como um espaço de preservação da cultura e resgate das tradições. 

7) Envolva os estudantes e as famílias na cocriação da festa junina

É muito importante que eles se sintam parte da celebração e que consigam reconhecer os seus múltiplos sentidos. 

8) Organize uma festa sustentável e consciente 

Envolva a comunidade escolar em uma experiência responsável, que evita o desperdício e gera responsabilização coletiva pelo descarte de lixo.

E AÍ, PROFESSOR(A), CURTIU O CONTEÚDO? DIGA O QUE ACHOU NOS COMENTÁRIOS. 

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