Devolutiva do professor deve equilibrar desafio e motivação de estudantes

Parte importante do processo de aprendizagem dos estudantes, os feedbacks podem ser usados ao longo do ano de forma a incentivar o desenvolvimento de crianças e jovens

Desde o nascimento, o ser humano aprende a cada segundo. Primeiro, a mamar. Depois, a comer, beber, andar, falar, escrever e por aí vai. Por isso, até o momento da morte, pode-se aprender a cada dia e, dessa forma, não existe alguém que detenha todos os conhecimentos.

Essa mesma lógica deve ser aplicada na escola. Mesmo diante daquele estudante que está muito à frente dos colegas, professores precisam estimulá-lo para que não se acomode e continue empenhado em suas descobertas educacionais. Por outro lado, alunos com dificuldades de aprendizagem também precisam ouvir palavras encorajadoras e não serem desmotivados por seus professores. Como encontrar esse equilíbrio?

No ambiente educacional, os docentes têm um papel central no processo de ensino-aprendizagem, o que envolve dar feedbacks aos alunos, ou seja, as devolutivas sobre o desempenho nas atividades propostas. Para entender o que está por trás dessas mensagens às crianças e jovens, bem como algumas técnicas para acertar o tom, a Vivescer conversou com Vanessa Zito, professora e especialista em psicopedagogia. Confira a seguir.

Vivescer: Qual é a importância do feedback personalizado e individualizado do professor no processo de aprendizagem dos estudantes?

Vanessa: Acredito que, em primeiro lugar, o feedback em relação às tarefas é respeitoso com o aluno. Essa devolutiva faz com que ele ou ela se sinta pertencente ao processo de aprendizagem. É diferente quando corrigimos uma tarefa e mandamos um recado automático, seja ‘parabéns’ para alguns ou ‘reveja’ para outros, de quando realmente paramos para olhar com mais sensibilidade, percebendo quais habilidades foram atingidas e quais ainda estão abaixo do esperado. Ao longo do ano, elenco algumas tarefas e atividades para realmente me dedicar ao feedback. Penso nas expectativas que tenho de aprendizagem, nas habilidades que os alunos precisam alcançar e, a partir disso, penso em devolutivas mais direcionadas, tanto escrita como de forma mais pessoal, com conversas para apontar caminhos para a criança desenvolver aquilo que ainda não foi possível.

Vivescer: Qual deve ser a postura dos docentes diante de estudantes que têm mais facilidade? Como é possível ser honesto com esse aluno e, ao mesmo tempo, garantir que ele não irá se acomodar no seu processo de aprendizagem?

Vanessa: Para estudantes que têm altas habilidades e que caminham com mais autonomia, o feedback se torna uma forma de ir além e desenvolver outras competências. Essa devolutiva pode, justamente, servir para que ele não se desmotive no seu processo de aprendizagem por estar em uma situação mais confortável. Eu trabalho com plataformas educacionais, então quando percebo que o aluno já está nessa posição mais avançada, passo desafios que não estavam no meu planejamento e observo como responde. Outra forma de estimular essas crianças é trazê-las como tutoras de colegas que precisam de mais apoio. Esse trabalho entre pares é uma forma de motivar os dois lados: tanto o aluno que já desenvolveu o que é esperado, como aquele que ainda não chegou nesse ponto.

Vivescer: Nos casos de estudantes que apresentam maior dificuldade, quais cuidados o professor precisa tomar para passar a mensagem de que é preciso melhorar, mas não desmotivá-lo completamente?

Vanessa: Quando vamos dar um feedback, precisamos olhar com sensibilidade para a atividade ou trabalho em questão, e elencar, sim, o que é necessário modificar, mas também ter um olhar cuidadoso para aquilo que o aluno conseguiu fazer e jogar o holofote em cima disso. Independente do retorno e da qualidade da tarefa, eu acredito que o professor precisa reforçar um ponto positivo com o objetivo de motivar. Além disso, escolher as palavras que vai direcionar à criança ou ao adolescente. Muito mais do que falar ou escrever, é necessário dar suporte, ensinar e mediar para que esse aluno consiga desenvolver a habilidade. Isso é muito importante para o processo de metacognição, ou seja, o estudante pensar no seu processo de ensino-aprendizagem, refletir sobre o que ele já sabe e sobre o que vai fazer para desenvolver aquilo que ainda não foi possível.

Vivescer: Esse trabalho entre pares pode ser um caminho para os casos em que a explicação do professor não consegue atingir alguns alunos?

Vanessa: A linguagem utilizada no trabalho entre os pares é muito mais próxima. Nesses casos, vejo o professor como um mediador desse processo, ou seja, pensar nos pares ou grupos, estabelecer um roteiro, elencar objetivos, ajustar o processo quando for necessário. Acho que é um conjunto: não é apenas a responsabilidade daquele aluno considerado excelente, e também não só do professor. É justamente o aluno como protagonista do processo de aprendizagem, o que vale tanto para aqueles que já atingiram o esperado como para os que ainda não.

Vivescer: Pode ser que, mesmo que sem intenção, professores acabem repetindo estereótipos no processo de ensino-aprendizagem que podem criar barreiras nos estudantes, como a frase ‘ciências não é para menina’ ou ‘você não é de exatas’. Como é possível contornar essas eventuais situações?

Vanessa: Isso é uma questão de mentalidade fixa e de mentalidade de crescimento. O feedback contínuo é importante nesse sentido. Ao elencar algumas atividades ao longo do ano para fornecer um feedback mais profundo, ajudamos que o próprio aluno possa perceber seus avanços e, com isso, mostrá-lo o quanto é capaz. Nesse processo, vamos ajudando-o a modificar essa mentalidade fixa de que não é bom em Língua Portuguesa, por exemplo, ou que não é bom em matemática. Por isso que também é importante pensar no suporte depois do feedback, ou seja, quais caminhos serão usados para que o estudante supere as dificuldades e quais mensagens serão usadas quando ele atingir seus objetivos. Tudo isso faz parte do processo de metacognição, durante o qual o aluno vai se conscientizando sobre seus avanços. Esse percurso demanda uma sensibilidade do educador, com um trabalho muito específico e cuidadoso.

Vivescer: Para terminar, qual seria o primeiro passo para quem deseja começar a entender mais a fundo o processo de dar retorno direcionados aos estudantes?

Vanessa: Eu acredito que o primeiro passo é se colocar no lugar do aluno. Há pouco tempo, concluí uma formação na qual me senti muito frustrada ao enviar tarefas e receber apenas uma nota. Quando eu e outros alunos fomos questionar, nos disseram que não era possível um retorno personalizado pela grande quantidade de estudantes no curso. Com isso, fui me desmotivando. Às vezes tinha uma nota muito boa, outras vezes nem tanto. Queria saber o que deveria modificar para a próxima entrega, não apenas para ter uma nota 10, mas para avançar no processo de aprendizagem. Antes disso eu não tinha esse olhar e essa experiência me ajudou muito como educadora. Passei a valorizar ainda mais esse retorno de atividades e tarefa de casa, com mais cuidado, respeito e atenção, porque sei o quanto pode fazer a diferença.

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