No Dia da Educação, diretor de escola fala sobre desafios da rede pública de ensino
Para Ramon Barcellos, diretor de escola pública, Educação segue como principal ferramenta de transformação social no país
Acolhimento, combate à evasão escolar com busca ativa, avaliação diagnóstica e recuperação da aprendizagem são apenas alguns dos temas que estão e permanecerão em alta na educação depois da pandemia de Covid-19. O fechamento de escolas, em muitos locais durante quase dois anos inteiros, aprofundou desigualdades e agravou processos de ensino que já eram complexos, como a alfabetização, os aprendizados adequados para cada faixa etária e a distorção idade-série.
Em razão do Dia da Educação, celebrado anualmente em 28 de abril, a Vivescer conversou com Ramon Barcellos, diretor da Escola de Ensino Fundamental e Médio Professor João Loyola, no município de Serra (ES), sobre o longo caminho a ser percorrido por educadores e escolas. Com 22 anos de trajetória na educação, Ramon é formado em História com especialização na área de ensino e trabalha na rede pública desde 2013.
Confira o bate-papo a seguir.
Vivescer: Quais são os principais desafios para a educação brasileira depois de dois anos de pandemia?
Ramon Barcellos: O maior desafio deste ano letivo é garantir o direito à educação de crianças, adolescentes, jovens e adultos, frente às desigualdades provocadas pelo momento pandêmico. Sem contar as desigualdades históricas, sejam de gênero, raça ou econômicas, que já existiam e se agravaram. Superar esse cenário requer dos educadores um olhar sensível fundamentado em equidade, para não fazer das salas de aula um ambiente que agrave a exclusão dos alunos dos processos de aprendizagem.
Vivescer: Desde o início do ano até agora, quais ações foram colocadas em prática para endereçar alguns desafios de aprendizagem?
Ramon: Do ponto de vista da aprendizagem, as primeiras ações da escola voltaram-se para a verificação e mensuração das habilidades e competências não consolidadas nos últimos dois anos, visando a recuperação. A partir de uma avaliação diagnóstica, os professores procuraram compreender o cenário de cada turma e aluno, suas particularidades e as habilidades que deveriam priorizar.
A rede estadual do Espírito Santo também esteve atenta a esse diagnóstico, elaborando uma Avaliação Diagnóstica da Rede sistematizada, aplicada para todos os alunos de todas as escolas em uma plataforma online específica ou com avaliações impressas. Após a avaliação, as escolas estaduais obtiveram um resultado preciso das habilidades e competências não consolidadas, o que permitiu um filtro por estudante em cada um dos componentes curriculares. Com todos esses dados, foi possível criar um plano de intervenção pedagógico embasado em evidências, que já está sendo colocado em prática.
Vivescer: E quais outras ações, não necessariamente pedagógicas, foram desenvolvidas?
Ramon: O ponto de partida para iniciarmos o ano letivo foi o acolhimento dos estudantes, especialmente os que vieram de outras escolas, muitos deles de redes que não ofertaram aulas presenciais por dois anos, afetando muito o convívio, a sociabilidade e a aprendizagem. Na prática, os professores e estudantes envolveram-se em dinâmicas e estratégias pedagógicas coletivas na primeira semana para entrosar os novos alunos ao ambiente escolar, gerando sentimento de confiança e segurança.
Não menos importante, destaco também a ação de busca ativa paulatina dos estudantes que confirmaram matrícula na escola e não frequentaram as aulas. Neste caso, a escola realiza contato com os estudantes e suas famílias, buscando compreender os motivos das ausências e criando soluções individuais para que os estudantes frequentem a escola.
Vivescer: A curto prazo, o que será necessário nos próximos meses para apoiar o processo de ensino-aprendizagem de crianças e jovens? A que os educadores e equipe pedagógica devem estar atentos?
Ramon: Desde 2019, a Secretaria de Estado da Educação do ES elaborou o PFA (Programa de Fortalecimento da Aprendizagem), que é uma ação de intervenção pedagógica que visa reduzir as desigualdades e dificuldades de aprendizagem em Língua Portuguesa e Matemática apresentadas pelos estudantes da rede estadual de ensino, a partir de estratégias pedagógicas de recuperação e reforço da aprendizagem. Em 2022, o programa foi ampliado, e os alunos contarão com oferta de aulas de reforço e recomposição de aprendizagens no turno ou no contraturno que frequentam a escola, dependendo da demanda e das condições de cada escola. Para essa ação, além do apoio do professor regente de sala, serão contratados novos professores de Língua Portuguesa e Matemática, com objetivo de focar no fortalecimento da aprendizagem dos estudantes. Em nossa escola, também ocorre uma força tarefa coletiva, onde os professores estão dialogando interdisciplinarmente, elaborando projetos que priorizem as habilidades consideradas críticas, após a análise dos dados diagnósticos e da verificação diária do cotidiano das salas de aula.
Vivescer: E a longo prazo, que desafios se apresentam à educação?
Ramon: Acredito que o maior desafio seja o saldo negativo de defasagem, especialmente dos estudantes mais vulneráveis. No contexto de pandemia, a prioridade de muitos foi sobreviver, não restando escolha: tornaram-se trabalhadores, na maioria das vezes em condição de informalidade. Essa necessidade de trabalhar relativizou ou anulou a participação de muitos adolescentes nas atividades escolares, e isso provocou um aumento do saldo negativo de defasagem, apesar de todos os esforços da escola e do poder público estadual para que isso não ocorresse.
Vale lembrar que, antes da pandemia, jovens em contextos mais vulneráveis já estavam em condição de desvantagem evidente, e a Covid-19 só agravou o quadro. Continuamos acreditando no papel social da escola como um espaço capaz de transformar trajetórias de vida dos estudantes, porém a realidade mostra que muitos de nossos alunos deram passos para trás na linha de partida da corrida em busca de oportunidades. Vamos seguir firmes, trabalhando muito e acreditando na educação como principal ferramenta de transformação social.
Vivescer: É possível apontar algo que não existia antes da pandemia e agora veio para ficar em termos de práticas na escola?
Ramon: A pandemia serviu e ainda serve como catalisadora de novos projetos, e muitos estão vinculados à tecnologia. Neste sentido, muitos professores desenvolveram habilidades que não estavam no radar e deram novo significado a sua prática de ensino, valendo-se de novas estratégias pedagógicas que estavam distantes da realidade há dois anos. O ensino híbrido veio para ficar, e a escola se reinventou adotando contínuas novidades. Após superarmos os desdobramentos provocados pela pandemia, certamente teremos uma escola de maior repertório pedagógico do que a escola antes da Covid-19.
Bom dia gostaria de saber quando vai ter curso novos…obrigada
Muito bom!