Professores analisam novos comportamentos dos alunos na volta às aulas

Longo período de aulas remotas gerou impactos no engajamento de crianças e adolescentes com a escola e os estudos

Empolgação e euforia misturadas com ansiedade, medo e insegurança. Compreender o turbilhão de emoções que alunos e professores estão sentindo nesse momento de retorno às aulas presenciais está longe de ser uma tarefa fácil.   

Enquanto uns se sentem animados para rever colegas, outros estão mais apreensivos diante dos riscos de contaminação pela Covid-19. Essa dualidade é um dos grandes desafios deste segundo semestre. Conversamos com alguns embaixadores da Vivescer sobre isso, confira abaixo os principais pontos que eles levantaram. 

Escola versus trabalho

Uma possibilidade é que o sentimento dos alunos diante da volta às aulas esteja relacionado a razões socioeconômicas. Por conta de desigualdades, nem todas as crianças e jovens tiveram acesso semelhante aos materiais educacionais durante o período que as aulas presenciais estavam suspensas. 

Aulas online e plataformas digitais à disposição não foram uma realidade para todos. Durante a pandemia, houve estudantes que precisaram suspender os estudos e buscar trabalho, muitas vezes para complementar a renda familiar. Esse é o caso de alguns alunos de Rita Vasconcelos, professora de língua portuguesa e coordenadora de uma escola da rede municipal de Castelo do Piauí (PI). 

“Nossos alunos do ensino médio quase não entregam as atividades. Muitos dizem que, com a escola fechada, foram trabalhar, enquanto outros viajaram para ficar com seus pais. Aqui é muito comum que as crianças morem com os avós enquanto os pais trabalham em outro lugar. Nas consultas realizadas, muitos demonstraram insegurança diante do retorno justamente pela chance de contaminar os mais velhos”, explica. 

Engajamento

Diante das dificuldades relacionadas ao engajamento dos estudantes, Rita explica que, diariamente, procura motivar suas turmas a estudar, tornando essa insistência um movimento diário, ensinado e reforçado em todas as aulas. 

Segundo a educadora, tem sido difícil manter, ou até mesmo construir, qualquer relação com seus alunos frente esse cenário de desmotivação. “Eles acabaram se fechando ainda mais no mundo deles. É uma batalha conseguir uma opinião sobre uma problemática, envolvê-los em um debate, ou até levá-los a falar abertamente sobre as suas perspectivas nesse momento. Eles se limitam a dizer que as aulas não servem para nada. É claro que há um pequeno grupo que se mantém resiliente no processo.” 

Carlos Henrique Patrício, ex-diretor de uma escola da rede municipal de ensino de Magé (RJ), comenta que foram necessários ajustes para promover o engajamento dos estudantes com as atividades propostas. Uma das iniciativas foi a adoção do plantão de dúvidas com os professores via WhatsApp, já que muitos alunos não compreendiam os textos dos cadernos pedagógicos enviados para suas casas. 

Além disso, o educador defende que alguns jovens estão vivendo o chamado “desencantamento com a escola”. “Minha cunhada comentou com o meu sobrinho ‘vamos que está na hora da escola’, ao que ele respondeu ‘a escola já era’. Aquilo me impactou profundamente.” 

Preocupação docente

Por conta desse comportamento, Carlos tem visto professores preocupados não apenas com questões relacionadas ao aprendizado, mas também com a saúde mental das crianças e jovens. 

“Depois de todo esse período sem aulas, os professores estão cientes que alguns alunos estão com dificuldades e tempos de aprendizagem diferentes. Nesse momento, eles estão fazendo tudo o que podem para ganhar a confiança desse aluno e trazê-lo novamente para escola, porque depois de ter ficado um tempo fora, eles precisam se sentir seguros”, explica.  

O desafio do acompanhamento

Ao mesmo tempo em que muitas escolas, e até mesmo professores de forma independente, buscaram formas alternativas de manter o contato com os alunos durante a pandemia, a falta de interação contribuiu para abrir um abismo entre a escola e o estudante. 

Segundo Rita, havia expectativa de que, com as aulas a distância, seus alunos desenvolvessem mais autonomia para estudar, o que não foi visto na prática. 

“Muitas crianças devolvem atividades em branco, justificando a ausência do professor e da escola. Eles dizem que estudar sozinho não dá. E os pais reafirmam isso, tanto que uma fala marcante entre eles é a de que as crianças não aprenderam nada neste período. Essa fala também se repete entre os estudantes do ensino médio. Muitos entendem que não aprenderam e, por isso, sequer se inscreveram no ENEM [Exame Nacional do Ensino Médio]”, expõe.  

Avaliação

Carlos reforça que o desafio do ensino atual também esbarra em outras questões, como a avaliação. “Se eu for avaliar um material impresso, mas aquele aluno não fez porque estava ausente no momento da pandemia e nós não conseguimos desenvolver independência e autonomia, então quem respondeu foi a família, não foi o aluno que fez. A cultura escolar diz que [a tarefa] precisa estar bonita, e muitas vezes o aluno não consegue fazer. Há a necessidade de que se compreenda que o estudante deve ser o protagonista, independente de a tarefa estar bonita ou não.” 

Alternativas

Carlos explica que, durante a pandemia, a escola na qual atuava enquanto diretor promoveu atividades alternativas como forma de manter os alunos engajados, diversificando a oferta de conteúdos. “Nós sempre falamos que é importante aprender matemática, português e outras disciplinas. É verdade, tem que aprender. Mas nesse contexto de pandemia, também precisamos pensar no que é possível, como oportunizar contextos familiares e reforçar a relação entre famílias e escola.” 

Nesse sentido, além de realizar lives lúdicas no Facebook, a escola promoveu desafios como a coleta de óleo de cozinha para fabricação de barras de sabão, que depois foram entregues para a comunidade. “Entregamos mais de 800 barras de sabão, tudo isso com apoio dos alunos que juntaram o óleo e participaram. Eles se sentiram parte do processo mesmo não estando na escola”.

Novas estratégias de aprendizagem

Sabemos que momentos como esse trazem importantes desafios para toda a comunidade escolar. 

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