Professores contam os principais desafios do fim de ano letivo
Exaustão mental e física, pouco tempo para muitas tarefas e sobrecarga estão entre as maiores dificuldades enfrentadas pelos docentes no final do ano
A rotina dos professores na reta final do ano letivo é bastante cansativa. É nessa época que os docentes precisam corrigir trabalhos e provas finais, fechar as notas e diários de sala, participar de conselhos de classe e realizar todas as tarefas relacionadas à conclusão do ano.
Os desafios são vários e de diferentes naturezas: ao mesmo tempo que é necessário lidar com alunos cansados e desmotivados, professores também investem um tempo considerável falando com familiares preocupados com a aprovação ou reprovação dos alunos. A falta de apoio por parte da coordenação pedagógica também é sentida e apontada por muitos, que reafirmam a importância de uma parceria ao longo do ano inteiro.
Dar conta de tudo isso em equilíbrio com a vida pessoal está longe de ser uma tarefa fácil. Para entender quais são os principais desafios enfrentados no fim do ano letivo e quais atitudes podem ajudar a diminuir o peso sobre a equipe docente, conversamos com professores e embaixadores da Vivescer espalhados pelo Brasil. Confira a seguir.
Os desafios
- Elaboração e correção de muitas atividades e provas, fechamento de diários, entrega de resultados;
- Uso de linguagem violenta para cobrança dos professores;
- Preocupação de alguns responsáveis apenas no final do ano letivo;
- Maior preocupação com o número de alunos reprovados do que com a aprendizagem em si por parte de Secretarias de Educação;
- Generalizações por parte dos professores durante conselhos de classe por falta de elementos suficientes para justificar a aprovação ou reprovação do aluno;
- Equipe pedagógica sobrecarregada com tarefas administrativas e falta de tempo para acompanhar os docentes em sala de aula;
- Dificuldades de contexto: desigualdade social, desinteresse e ansiedade dos estudantes, evasão;
- Processo de recuperação de estudantes que não atingiram os níveis de aprendizagem desejados;
- Instabilidade e falta de garantia sobre o local de trabalho do ano seguinte para professores não concursados, o que gera ansiedade e insegurança;
- Exaustão mental e física;
- Longas jornadas de atuação em mais de uma escola;
- Conselhos de classes que focam apenas nos problemas, mas não nas soluções.
Os desafios em tempos de pandemia
- Dificuldade em fazer revisões de conteúdos no modelo híbrido, com apenas metade das turmas;
- Falta de confiança no trabalho do professor diante das aulas remotas, o que gera sentimentos de incapacidade, acarretando improdutividade.
O que aconselham
- Evitar deixar para fazer o lançamento de todos os diários de classe no sistema no final do ano. Isso evita perda de trabalho caso haja um pico de acessos e o sistema trave;
- Escuta ativa dos alunos, colocando-os no papel de protagonista e dando voz na resolução de conflitos;
- Priorizar conteúdos mais importantes para a construção do conhecimento dos estudantes;
- Investir em organização para evitar acúmulo de demandas, como um cronograma de ações prioritárias e um bom planejamento semanal para dar conta de tudo;
- Buscar um diálogo respeitoso e sensível com a coordenação e com colegas professores;
- Articulação com famílias para entender os estudantes que faltam muito;
- Busca de apoio de colegas professores para união de esforços;
- Garantir momentos de pausa, com a realização de atividades como leitura e caminhada;
- Envolvimento dos estudantes.
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O que querem
- Reconhecimento por parte da sociedade da importância do trabalho docente para a construção de uma mudança significativa no país;
- Mais apoio e confiança no trabalho docente por parte da equipe gestora, principalmente da coordenação pedagógica, ouvindo as demandas e percepções dos docentes durante todo o ano letivo;
- Acompanhamento por parte da família e da equipe pedagógica durante o ano inteiro, e não apenas no final do ano letivo devido à preocupação pela aprovação ou reprovação dos alunos;
- Atenção e respeito à profissão e à rotina do professor;
- Evitar romantizar sacrifícios e excessos;
- Que a sociedade acolha e aplauda as boas práticas dos professores e use esses exemplos como ferramentas de reivindicação e luta para que seja assegurado um direito que é de todos.
O que dizem
“O processo de encerramento do ano letivo é tão importante quanto o início ou qualquer outro momento da vida escolar. Por isso, eu proporia maior participação das famílias nas reuniões, assembleias e demais encontros com a escola, equipes pedagógicas, direção e professores, pois esse apoio é primordial. Além disso, também é importante que nós, professores, tenhamos garantidos um terço de nossa jornada para planejamento. Isso não deve ficar apenas no papel. Esse ponto entra no debate sobre a valorização do professor, que não deve ser apenas financeira, mas também a garantia de condições dignas de trabalho.”
Carla Borges
Sarzedo e São Joaquim de Bicas – MG
“Nesse momento, eu sempre uso uma estratégia de não me cobrar e não me punir. Já tive época que eu fazia muito isso, mas passei a não me culpar. Hoje, eu converso mais. E uma coisa que dá muito certo é utilizar o meu plano de aula para escrever pequenos relatos do meu dia a dia, para que isso possa, de alguma forma, não retirar o saldo negativo ou fazer com que ele desapareça, mas para que eu possa, primeiro, reconhecer talvez uma falha ou algo negativo na minha prática e que eu possa refletir nesse fechamento para o final de ano.”
Carlos Henrique Patrício
Magé – RJ
Embaixador Vivescer
“É muito comum, na época do conselho de classe, ver professores definindo o futuro de um aluno com base em estereótipos e vieses inconscientes. Tenho trazido o olhar para os currículos ou matrizes de competências. Caso algum professor traga para a pauta que um dos alunos deve ser reprovado, busco investigar quais habilidades não foram desenvolvidas, qual foi o delta de desenvolvimento do aluno em questão e, por fim, desafio o professor a dizer o que devemos fazer para recuperar o aprendizado desse aluno caso ele de fato seja reprovado. Não é um trabalho fácil, mas ajuda muito a sermos justos.”
Felipe Herszenhaut
São Luís – MA
Embaixador Vivescer
“Uma das estratégias que uso é estabelecer com a escola e seus atores uma relação de pertencimento, observando que o espaço de atuação docente pode – e deve – ser um lugar de crescimento pessoal e profissional, mas também um lugar onde podemos e devemos ser felizes. Quando ocorre essa boa relação de pertencimento, a docência ganha outros significados que iluminam a prática do professor, agregando muito mais felicidade e diminuindo o adoecimento entre os nossos professores.”
José Gilson Lopes Franco
Fortaleza – CE
Embaixador Vivescer
“O que eu gostaria muito é que a sociedade tomasse conhecimento dos bastidores da profissão que só nós, professores, sabemos. Às vezes, ficamos desestimulados de seguir a carreira, mas o gosto pelo o que fazemos é mais forte e continuamos em busca de respeito, reconhecimento e justiça social para nossa classe. Acredito que falta na nossa profissão o reconhecimento local que, para mim, supera qualquer prêmio. Fazemos tanto pela educação local e muitas vezes o que recebemos é a indiferença. Ser professor, atualmente, é resistência.”
José Souza dos Santos
Paripiranga – BA
Embaixador Vivescer
“Eu procuro avaliar as habilidades dos alunos que estiveram ausentes muitas vezes da sala de aula. Faço atividades para ver se têm condições e maturidade e se as habilidades foram alcançadas para que possam assumir uma nova série. Para isso, seleciono aqueles alunos que tiveram maior índice de faltas e procuro fazer reuniões com os responsáveis, para que possam ter uma frequência mais positiva. A partir daí, crio uma estratégia para atender esse aluno individualmente, para que em menos tempo possível ele possa desenvolver as habilidades que ainda não desenvolveu, analisando caso a caso quem consegue ser promovido para o próximo ano. A reprovação fica em último caso.”
Luciane Fernandes Ribeiro
Marabá – PA
Embaixadora Vivescer
“Nós, professores, trabalhamos um ano inteiro com muitas dificuldades, mas mesmo assim o fazemos com muito zelo. Não adianta cobrar resultado do professor e dos estudantes no último mês. Somos pessoas. Muitas vezes trabalhamos em duas ou mais escolas, com alunos de diferentes modalidades, cada um com suas especificidades. Na maioria das vezes, gerimos sozinhos as dificuldades cotidianas, temos de encontrar alternativas para superá-las. Se cada segmento da sociedade fizesse sua parte, não tenho dúvidas de que o final de um ano letivo seria mais leve.”
Rita Vasconcelos
Castelo do Piauí – PI
Embaixadora Vivescer
“O cansaço físico e mental é bem acentuado neste período. O trabalho intensifica, exigindo a resolução de variadas situações, recuperação de aprendizagem dos alunos, ajustes e fechamento das notas, finalização das documentações, burocracia do sistema, produção de relatórios. Tudo isso gera um acúmulo de trabalho e junto com o desgaste já vivido durante o ano, o corpo fica mais sensível. Para vencer este período, ou amenizar, procuro organizar um cronograma das ações prioritárias, e sempre garantindo um tempo de pausa.”
Rosiane Ribeiro Justino
Joinville – SC
Embaixadora Vivescer
“A maior parte do meu trabalho como professora foi no Fundamental I e lembro da dificuldade de dar conta do volume de avaliações. Virava noites ‘engolida’ por papéis, tentando descobrir de quem era aquela prova sem nome, lançando notas em planilhas, traçando médias, fazendo relatórios individuais… Com o passar do tempo, fui adquirindo experiência e vi que muitos dos meus desafios aconteciam porque não envolvia os meus estudantes nos processos. Passamos a decidir juntos que tipo de trabalho fazia sentido para o fim do bimestre e, dessa forma, parei de chegar ao fim do ano letivo sobrecarregada e sem evidências de que aprendizagem estava realmente ocorrendo.”
Suzane Napolitano
Rio de Janeiro – RJ
Embaixadora Vivescer
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