Campanha propõe reflexão sobre mudanças necessárias nas escolas no pós-pandemia
Iniciativa do Centro de Referências em Educação Integral, a campanha #ReviravoltaDaEscola reúne ideias para um novo modelo de escola que faça sentido para educadores, alunos e famílias
Incentivar uma reflexão sobre qual é o papel da escola hoje e no cenário de pós-pandemia, bem como assegurar que a transformação da educação seja sinônimo de garantia de direitos são alguns dos principais objetivos da campanha #ReviravoltaDaEscola.
Apesar de o momento de emergência ter delimitado o que é possível de ser feito, Helena Singer, vice-presidente da Ashoka para a América Latina – uma das organizações que integram a campanha –, explica que tem visto algumas iniciativas que estão tentando promover mudanças, ainda que pontualmente.
“Tenho recebido notícias de coisas novas que se criam sem necessariamente um planejamento, mas que são, de fato, muito transformadoras no universo escolar. Um exemplo simples: a professora estava dando aula e a avó de um dos alunos estava no mesmo ambiente do neto e acompanhou a aula. Aquilo não estava no planejamento e a professora não estava preparada, mas a participação da avó na aula foi muito rica e contribuiu para a conversa. Outro caso é que professores percebem que os alunos não estão realizando nenhuma tarefa de casa. Assim, decidem se organizar e mandar uma única proposta conjunta. O trabalho interdisciplinar, que nunca antes foi colocado em pauta e planejado em uma escola regular, passa a acontecer”, explica Helena.
Diante de inúmeros debates que estão marcando a educação nesse momento, como discussão sobre o retorno ou não das aulas presenciais, a vacinação de professores e funcionários e o atendimento prioritário às crianças e jovens, Helena reforça que um movimento como a #ReviravoltaDaEscola é importante por promover uma mudança coletiva de postura e atitude.
“O que nós podemos fazer é aprender com essa experiência para projetar um mundo melhor que esse. Precisamos entender o que causou a pandemia e como nos organizamos enquanto humanidade para evitar que aconteça novamente, além de, coletivamente, reinventar práticas, instituições, relações e projetos. Isso nos dá energia e ânimo e estimula a solidariedade, pois é um trabalho colaborativo que ajuda a não cair no desespero e enxergar novas possibilidades.”
Participação das famílias
Algumas escolas já estão usando o momento de suspensão de aulas presenciais para repensar seu funcionamento e os moldes das instituições de ensino brasileiras. É o caso do Centro Municipal de Educação Infantil Pio Bittencourt, em Salvador (BA). Sob a gestão de Consuelo Almeida, o centro deu início, em 2020, a um processo de reconstrução de suas práticas.
A instituição já contava com alguns projetos que prezavam pela gestão democrática da escola, o que implicava na ampla participação das famílias em diversos processos, bem como na intersetorialidade, isto é, parceria com diversos setores e instituições em prol do bom cuidado para com as crianças, como postos de saúde, universidades e conselho tutelar, por exemplo.
Consuelo explica, ainda, que mesmo que a prefeitura de Salvador tenha os protocolos próprios de retorno que as escolas devem seguir, cada instituição pode elaborar suas diretrizes. Para isso, a escola realizou algumas pesquisas junto às famílias, como para entender quais redes sociais eram mais utilizadas e quais seriam as mudanças necessárias na rotina da instituição para aquelas que se sentissem confortáveis em mandar novamente os filhos para a escola.
“Nós procuramos ouvir essas famílias sobre as estratégias que usamos nos vídeos produzidos pelos professores e também nos blocos de vivência impressos. Quisemos saber o que acharam da qualidade dos materiais, se estavam ajudando ou não, se eles conseguiam entender as propostas e quais eram as maiores dificuldades, ao que responderam que era o tempo para estar junto com a criança e executar as atividades”, afirma a gestora.
Atenção ao professor
Antes de todo esse processo, entretanto, a escola precisou dar dois passos atrás para atender a equipe de professores e funcionários, que, com a chegada da pandemia no Brasil e a falta de respostas concretas sobre o cenário, sentiu-se vulnerável e fragilizada. Nesse sentido, Consuelo explica que a instituição continuou com a ideia de pensar articulações com as famílias nesse momento inicial e, paralelamente, também apoiar os próprios funcionários da instituição por meio de uma rede de parceiros.
“Nós trouxemos terapeutas e psicólogos para realizarem oficinas de relaxamento e respiração, promovemos uma conversa com uma infectologista da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) para explicar a doença e criamos o Café Pedagógico, que são encontros sobre poesia e bate-papo. Se alguém demandasse um atendimento mais individualizado, verificávamos se algum psicólogo poderia atender gratuitamente. Com isso, fomos fortalecendo nossa equipe para que, depois, o planejamento pudesse fluir.”
Outro ponto de destaque ao longo de 2020 foi a possibilidade de entrar em contato com redes de ensino de outras regiões e compreender o que estavam vivenciando e quais soluções estavam adotando para seus desafios. Nessa linha, ela reforça a importância de considerar as particularidades e características dos territórios, bem como incentivar a participação de diversos atores na elaboração dos protocolos de retornos e das mudanças que serão necessárias para as escolas no pós-pandemia.
“Não dá para o Executivo e as secretarias de educação do município ou do estado fazerem protocolos únicos ou pensarem a rede como uma só. É importante que se pense não de forma globalizada nem uniforme, mas sim respeitando as especificidades de cada local a partir de uma escuta”, completa.
Foto: jcomp/Freepik
* Conteúdo em parceria com Porvir
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